Cardioglicosídeo

(em inglês) Diagrama representando estrutura geral de um cardioglicosídio. À direita, há ligação, por intermédio de um heteroátomo de oxigênio, de um açúcar ao Núcleo Aglicona Esteroide (aneis A, B, C e D)
Dedaleira (Digitalis purpurea)

Os cardioglicosídeos ou digitálicos constituem um grupo de fármacos usados no tratamento de doenças do coração, nomeadamente de arritmias e insuficiência cardíacas.[1]

Os digitálicos existem naturalmente em diversos géneros como Digitalis nomeadamente Kalanchoe e uma planta venenosa também conhecida por dedaleira (Digitalis purpurea), selvagem na Europa e nomeadamente em Portugal.

Usos clínicos

Cardioglicosídeos promovem uma queda no número de contrações cardíacas. São usados para corrigir as arritmias por flutter ou fibrilação auricular e arritmias supraventriculares. São contraindicados em síndrome de Wolff-Parkinson-White. São indicados quando os diuréticos e inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECAs) não forem suficientes para controlar a situação, em casos de insuficiência cardíaca crónica.

Mecanismo de ação

Os digitálicos inibem a bomba de sódio (ou Na+/K+ ATPase) que existe nas membranas das células, sobretudo nos miócitos cardíacos. Apesar dessa proteína existir em todas as células, nas concentrações usadas terapeuticamente, só as células musculares e os neurónios são afetadas significativamente. A atuação dos digitálicos sobre cardiomiócitos envolve transportadores transmembrana importantes, a bomba de sódio/potássio supracitada e o transportador NCX.

Normalmente, a bomba de sódio/potássio atua expulsando 3Na+ para o meio extracelular para cada 2K+ importados para o meio intracelular. Desta forma, a inibição da bomba pelo digitálico bloqueia uma das principais vias de perda de Na+ na célula, levando ao acúmulo de Na+ no meio intracelular. O aumento de Na+ intracelular impacta no funcionamento de outro transportador, o trocador sódio/cálcio (NCX), que, diferente da bomba sódio/potássio, não requer ATP para funcionar. Os trocadores sódio/calcio utilizam a tendência natural do Na+ de entrar na célula para expulsar cálcio intracelular, em um processo denominado antiporte. Esse transporte não gasta ATP, porém depende do gradiente de concentração do sódio. Com o aumento da concentração intracelular de sódio mediante bloqueio da bomba sódio/potássio, a conductibilidade do trocador NCX ao cálcio irá diminuir, uma vez que o gradiente de concentração de sódio também diminuirá. Assim, o cardiomiócito apresenta aumento na retenção de cálcio intracelular, prolongando o potencial de ação e diminuindo o ritmo cardíaco.[2][3]

A maior quantidade de íon sódio intracelular e a menor concentração de ion potássio alteram a excitabilidade de neurónios no cérebro e dos miócitos do coração.

Efeitos

Efeitos Adversos

Os digitálicos também alteram a excitabilidade de vários núcleos neuronais e do sistema nervoso intestinal, do que decorrem efeitos secundários:

  • Naúsea
  • Vômitos
  • Diarréia
  • Ligeira ginecomastia nos homens.
  • Confusão mental, alterações visuais, alucinações (raras)
  • Raramente arritmias (batimento cardíacos caóticos): apesar de ser usado para corrigir arritmias por fibrilhação auricular, doses elevadas de digitálicos causam também arritmias por fibrilhação ventricular.

Interações

Apresentam muitas interações com vários fármacos, como a quinidina e antibióticos.

Fármacos mais conhecidos do grupo

  • Digoxina: existe nos tecidos da planta dedaleira. É a mais utilizada.
  • Ouabaína: pouca solubilidade aquosa.
  • Digitoxina: alta solubilidade em água.
  • Metildigoxina

História

As infusões de dedaleira sempre foram usadas com algum sucesso na medicina tradicional.

Os seus efeitos farmacológicos no ser humano foram pela primeira vez descritos com exactidão pelo médico e botânico inglês William Withering, no ano de 1775. A partir daí começou a ser usada de forma mais cientifica.

Referências

  1. FQM Divisão Médica. Dicionário Médico Português.
  2. Babula P, Masarik M, Adam V, Provaznik I, Kizek R (September 2013). «From Na+/K+-ATPase and cardiac glycosides to cytotoxicity and cancer treatment». Anti-Cancer Agents in Medicinal Chemistry. 13 (7): 1069–1087. PMID 23537048. doi:10.2174/18715206113139990304  Verifique data em: |data= (ajuda)
  3. Aires, Margarida de Mello, Vários Fisiologistas - Fisiologia 3a. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008
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